28 de jun. de 2009

gênios que trabalham: estudar mais ou jantar fora com maior frequência?

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“Os croquis iniciais do Museu Real de Ontário foram desenhados em guardanapos, e aconteceu de ficarem tão próximos do projeto final, que os próprios guardanapos foram exibidos”
Daniel Libeskind, no The Observer (23/10/2007)


Certos procedimentos projetuais, típicos do mundo acadêmico, raramente são usados no exercício profissional.
Embora esses campos se acusem mutuamente de serem superficialmente pragmáticos ou alienadamente teóricos, é natural que hajam diferenças acentuadas no modo como projetos são elaborados numa e noutra esfera, pois os objetivos são muito diferentes: numa, o projeto é instrumento para a construção, na outra é instrumento de aprendizado.

Um procedimento muito comum é a indução a que o estudante mantenha a sua concepção inicial até o fim, sem alterações significativas. Nesse contexto, projetar seria como executar uma receita culinária. No meio da elaboração de um feijão tropeiro, ninguém resolve mudar para salpicão de frango, pois os ingredientes estão ali, tanto quanto a predisposição do mestre cuca.
Num projeto é diferente. Os ingredientes, pelo menos os principais que são o terreno e o programa, também estão ali, mas o que parecia uma ótima escolha à primeira vista, num estudo mais aprofundado pode se revelar inadequado. Mais: as alternativas de solução são muitas e variadas.

Na vida profissional, estudar soluções diferentes e mesmo opostas é relativamente comum, embora muitos arquitetos façam questão de ressaltar que receberam a luz do divino num bar e rapidamente rabiscaram o projeto num guardanapo de papel. É curiosa a freqüência com que o espírito da criatividade baixa em lugares com guardanapos e que os tais sempre sejam de papel. Isso pode levar à conclusão de que o canal de sensibilidade dos arquitetos é o estômago e que não valorizamos estabelecimentos com guardanapos de pano. Mas seria precipitado.

Por outro lado, variações de projeto apressadas e sob pressão, como a que foi feita por Niemeyer, na polêmica Praça da Soberania (?), em Brasília (ver post abaixo: "de volta à prancheta"), podem resultar pouco consistentes e revelar falta de convicção, tanto nos princípios iniciais quanto na sua posterior avaliação. Naquele caso, o principal elemento do projeto, um obelisco em forma de "L", com 100m de altura foi objeto de pura e simples redução proporcional, passando a ter a metade da altura. Seja por equívoco na escala ou nos custos, o obelisco deveria ter sido substituído por outro, concebido para a escala pretendida. Mal comparando, se a caixa-forte do Tio Patinhas for reduzida a um cofrinho, perde o significado.

Voltemos ao projeto de mão única, ou aquele que não se desvia do seu destino. Quando ouço arquiteto ou estudante afirmarem que “a idéia não mudou nada desde o início”, penso: o que deu errado?
Projetar é um processo de aprofundamento sucessivo num problema e não o processo de representar uma idéia no papel. Sendo assim, na medida em que os estudos vão sendo elaborados, a nossa capacidade de produzir melhores idéias aumenta, o que torna a hipótese de acertar na mosca, de primeira, puro golpe de sorte, exceção e não regra.

O projeto do Museu Gugenheim, de Nova York, de Frank Lloyd Wright é um bom exemplo disso. Num dos estudos iniciais, Wright propôs uma estrutura hexagonal, azul. Já no esquema que se encaminhou para o definitivo, a sua indicação era nada menos que um volume vermelho. Essa escolha não agradou ao empreendedor Salomon Guggenheim, que sugeriu um mármore amarelado ou então, verde. Frank colocou também a alternativa de um mármore negro: claramente, a sua intenção era contrastar com as construções próximas.
Ao final de muitas especulações, prevaleceu um tom amarelado, substituído na última hora por um matiz mais claro de creme.
As alterações na volumetria, mesmo depois de definida a forma geral, também são significativas.


























































Ver mais no artigo de Christopher Gray, articulista do New York Times.
Os desenhos são da Fundação FLW e do acervo do Guggenheim.

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